Supermercado faz acordo milionário com estado e dinheiro será usado no combate ao racismo estrutural
19/09/2023 14:40 em Bahia

A rede de supermercados Atakarejo indenizará o Estado da Bahia em R$ 20 milhões, após o caso de racismo envolvendo o estabelecimento, que terminou com as mortes de Bruno e Yan Barros, em Salvador. O acordo coletivo para foi homologado na segunda-feira (18), a partir de ações civis públicas.

 

 

O valor será pago em 36 parcelas e empregado no Fundo de Promoção do Trabalho Decente (Funtrad). As ações que culminaram no acordo coletivo partiram da Defensoria Pública da Bahia (DPE-BA) – pela Justiça comum –, da ONG Educafro e do Centro Santo Dias – ambos pela Justiça do Trabalho.

 

A família de Bruno e Yan, que são tio e sobrinho, não terá acesso ao valor deste acordo. Para a homologação, o supermercado pediu a presença da DPE-BA, da Defensoria Pública da União, do Ministério Público da Bahia e do Ministério Público do Trabalho. Além da indenização, outras 41 cláusulas foram acordadas. (Veja algumas abaixo)

 

Quem receberá o dinheiro?

 

O Fundo de Promoção do Trabalho Decente é um braço da Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte (Setre) e foi criado há 12 anos para captar recursos que são investidos em ações para melhoria de condições de trabalho.

Grande parte dos recursos adquiridos pelo Funtrad vai para a formação de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade financeira e social. Entre as ações executadas pelo fundo estão: a criação de projeto para erradicação do trabalho infantil e o financiamento de cursos para qualificação profissional de jovens da periferia de Salvador.

No caso da indenização relativa às mortes de Bruno e Yan, os R$ 20 milhões custearão, preferencialmente, iniciativas relacionadas ao combate do racismo estrutural, de acordo com o MP-BA.

Procurada para comentar o assunto, a rede de supermercados enviou nota ao g1. Confira o conteúdo na íntegra:

Nota à imprensa

 

"O Atakarejo informa que assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), juntamente com o Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho, Defensorias do Estado e União e ONGs representativas, no qual se compromete a investir em programas de combate ao racismo estrutural e ao aprimoramento de políticas e práticas para diminuir a desigualdade. Esses novos investimentos se somarão a projetos que a empresa já mantém há mais de 29 anos, como o Inklusão, focado em contribuir para a redução das desigualdades e violações de direitos de pessoas negras e indígenas, mulheres, pessoas idosas, comunidade LGBTQIAP+, pessoas com deficiência e outros grupos sub-representados socialmente.

A história do Atakarejo é a de uma empresa alicerçada em muito trabalho, dedicação e respeito pelas pessoas, nascida com o propósito de gerar emprego e renda, reduzir o custo de vida da população Baiana e diminuir a desigualdade social."

 

Cláusulas acordadas pelo Atakarejo

 

NOS PRÓXIMOS 90 DIAS:

 

  • Não realizar a contratação de empresa de segurança patrimonial que detenha nos quadros empregados policiais civis ou militares da ativa ou que tenham sido expulsos das instituições; que mantenha entre seus empregados pessoas com condenação transitada em julgado por crimes em que haja o emprego de violência física ou psíquica; que seja gerida por policiais da ativa ou que tenham sido expulsos; que contrate policiais da ativa para realização de serviço ocasional; ou que não esteja devidamente registrada e autorizada para operar;
  • Não proibir a filmagem das abordagens realizadas pelos trabalhadores ou colaboradores nas dependências dos estabelecimentos e/ou quando estejam, fora desses limites, exercendo atividade profissional em benefício do Atakarejo.
  • Manter um canal ativo de denúncias de racismo entre trabalhadores;

 

 

NOS PRÓXIMOS SEIS MESES:

 

  • Atualizar o seu Código de Ética e Conduta para reforçar, de modo objetivo, a proibição de práticas discriminatórias ou que possam gerar constrangimento e demais riscos identificados e qualquer forma de violência física ou moral por qualquer um dos trabalhadores, bem como revisar o conteúdo de sua política de diversidade e inclusão reforçando a ideia de tolerância zero à discriminação;
  • Não poderá adotar e tolerar qualquer ato ou conduta que possa ser caracterizada como prática discriminatória em razão de raça, idade, orientação sexual, gênero ou deficiência envolvendo seus empregados;

 

NOS PRÓXIMOS 12 MESES:

 

  • Espelhar, no quadro de trabalhadores, a proporção racial aferida na Bahia conforme o mais recente censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

 

 

Relembre o caso

 

⚫️ Bruno e Yan Barros, de 29 e 19 anos respectivamente, foram encontrados mortos a tiros e com sinais de tortura em 26 de abril de 2021. Os corpos foram deixados dentro de um carro, na localidade da Polêmica, região periférica da capital baiana.

⚫️ Inicialmente, a Polícia Civil havia afirmado que o crime teria relação com o tráfico de drogas, no entanto, as investigações tomaram outro rumo. Tio e sobrinho foram pegos por funcionários do supermercado Atakarejo, no complexo do Nordeste de Amaralina, enquanto tentavam roubar peças de carne.

 

⚫️ Além do crime de constrangimento ilegal, seguranças do mercado agrediram Bruno e Yan, e tentaram extorquir as duas vítimas em R$ 700 para liberá-los. Bruno chegou a mandar uma mensagem de áudio e a ligar para uma amiga, pedindo o dinheiro para “pagar as carnes”. Na mesma ligação, o tio de Yan Barros relatou que os seguranças estavam entregando a dupla para os traficantes, o que aconteceu em seguida, segundo a polícia.

⚫️ O caso ainda não foi a julgamento. O Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA) denunciou 23 pessoas pelos seguintes crimes: homicídio qualificado, ocultação de cadáver e omissão de socorro qualificada. Entre os denunciados estão:

 

  • O gerente-geral da loja Agnaldo Santos de Assis e os prepostos Cláudio Reis Novais e Cristiano Rebouças Simões (denunciados pelos crimes de homicídio qualificado por motivo torpe, meio cruel e sem possibilitar a defesa das vítimas, constrangimento ilegal e extorsão);
  • Victor Juan Caetano Almeida, David de Oliveira Santos e Francisco Santos Menezes - apontados como responsáveis por entregar as vítimas aos executores (denunciados por crimes de homicídio qualificado e cárcere privado);
  • Lucas dos Santos, João Paulo Souza Santos, Alex de Oliveira Santos, Janderson Luís Silva de Oliveira e Rafael Assis Amaro Nascimento - identificados como autores da execução (denunciados por homicídio qualificado);
  • Michel da Silva Lins e Ellyjorge Santos Lima (denunciados por ocultação de cadáver)
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