Serigatti está otimista com o governo de Biden e avalia que o Brasil deve aproveitar este momento para "mitigar os problemas ainda existentes" no agronegócio.
"Se o pessoal está oferecendo recursos para que a gente resolva o problema do desmatamento, vamos aproveitar a oportunidade para revertê-lo", diz o pesquisador da FGV ao se referir à declaração de Biden, durante o mesmo debate eleitoral, de que ele levantaria "US$ 20 bilhões (...) para o Brasil não queimar mais a Amazônia".
Para Serigatti, o grande desafio do agronegócio daqui para a frente é trabalhar para reverter a imagem negativa do setor, construída tanto por declarações de lideranças de outros países como do Brasil.
"Precisamos trabalhar para reverter essa imagem mostrando as coisas positivas que já temos. Quando a gente olha para a produção de grãos, por exemplo, nós já adotamos técnicas de baixa emissão de carbono", aponta Serigatti. "E, em relação à pecuária, nós fizemos, de 2010 a 2018, uma recuperação de pastagens degradadas do tamanho do Reino Unido.
O presidente da consultoria Datagro, Plinio Nastari, diz que o Brasil "é um grande protagonista da agenda climática" e que, por isso, o retorno dos EUA ao Acordo de Paris, anunciado horas antes da posse de Biden, só traz benefícios.
O consultor destaca ainda que a experiência de Biden como legislador o fez visitar diversas vezes o Brasil e que isso faz com ele conheça a realidade do país.
"Não podemos desprezar que 46% da matriz energética brasileira é renovável. Nós somos o país que mais substituiu combustíveis líquidos fósseis em todo o planeta. Nós já substituímos mais de 45% da gasolina e 12% do diesel", diz Nastari.
"O retorno de Biden ao Acordo de Paris é muito salutar. É um acordo do qual o Brasil faz parte, mas que não tem atuado muito. Mas não há saída para nós a não ser embarcar de forma mais séria nas questões ambientais, caso contrário, vamos ficar na contramão do mundo”, afirma Marcello Brito, presidente do conselho diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).
"A vastíssima produção do agronegócio é feita sob normas muito fortes, até maiores do que no mundo todo. Há, sim, problemas que precisam ser resolvidos dentro do setor, mas a nossa produção é feita sob regras muito rígidas", completa Brito.
Nastari, da Datagro, diz que ainda há muito desconhecimento com relação ao desmatamento. “O que motiva é a atividade ilegal e criminosa, que não está ligada à produção organizada de alimentos, que está suportada por certificações”, afirma.
"O setor organizado da produção de alimentos, a agroindústria, não desmata porque sabe que será penalizado. Tudo está ficando integrado, digitalizado, não tem como você esconder mais", conclui o consultor.
Brasil e EUA são grandes competidores na venda de grãos, disputando o maior cliente mundial, que é a China.
O agronegócio brasileiro aumentou as exportações para o país asiático durante o governo Trump, depois que a China praticamente parou de comprar soja dos EUA em meio à longa disputa que culminou com um acordo comercial em janeiro de 2020.
Por esse acordo, que ainda vigora, a China se comprometeu a adquirir US$ 36,5 milhões em produtos agrícolas dos EUA apenas no ano passado.
Para Serigatti, ainda que haja uma expectativa de que o governo de Joe Biden tenha uma relação melhor do que Trump com os chineses, isso não significa que os dois países irão parar de "disputar por hegemonia" no cenário global. Ou seja: as tensões não deixarão de existir.
Segundo ele, o acordo entre EUA e China também não significa que o Brasil irá diminuir as suas vendas de produtos agrícolas ao país asiático no curto prazo.
"A China está demandando muitos grãos, recompondo o seu rebanho de suínos (que usam a soja como ração). E ninguém consegue atender a esta demanda como o Brasil", afirma.