LOJA QUE CONTROLAVA PESO DE VENDEDORA ALEGA 'PREOCUPAÇÃO DE PAI PARA FILHA'.
22/12/2020 10:37 em Brasil

Condenada em primeira instância, uma loja de bijuterias de Muriaé (MG), acusada de controlar o peso de uma vendedora e vincular parte de sua remuneração ao emagrecimento, alegou em recurso ordinário que a conduta do sócio era "uma preocupação de pai para filha". A Justiça do Trabalho havia estipulado que o estabelecimento pagasse R$ 50 mil de indenização à funcionária por danos morais. A sentença proferida pela 1ª Vara de Trabalho de Muriaé reconheceu que houve assédio moral por parte do empregador. Na última semana, a Procuradoria do Trabalho de Juiz de Fora também instaurou um procedimento para apurar o caso. No recurso, a defesa argumenta que o sócio da loja tinha "uma preocupação com o bem-estar" da funcionária, uma relação similar à de "pai para filha". Justifica ainda que se tratava de conselhos e que ele "não ficava diante de todos e até mesmo diante de clientes, constrangendo a vendedora". E citou que o dono teve o "mais puro intuito de incentivar a desenvolver hábitos saudáveis". "A própria recorrida estava ciente e aceitou os conselhos dados pelo sócio da recorrente para seu próprio bem e em nenhum momento se insurgiu em seguir os conselhos de seu patrão, tanto que passou a frequentar a academia, visando seu bem estar, sua saúde, tanto que segundo a única testemunha ouvida nos autos, até conseguiu perder peso", escreveu a defesa. Segundo a ação, a vendedora recebia pouco mais de um salário mínimo, que era complementado com uma quantia de R$ 200, caso ela atingisse uma meta de peso estabelecida pelo sócio da loja. Conforme narrado no processo, a loja alegou, inicialmente, que era um prêmio por desempenho. Depois, afirmou que não se tratava de pagamento extrafolha e justificou que apenas "ajudava" a funcionária nos gastos com academia e alimentação mais saudável. Na decisão, o juiz Marcelo Paes Menezes escreveu que o sócio do estabelecimento estipulava, a seu bel-prazer, a perda de peso sem embasamento científico e ignorava as particularidades biológicas do organismo da vendedora. Ele classificou a prática como "lamentável" e "inadmissível". Em sua argumentação, o magistrado ainda usa áudios e bilhetes arrolados ao processo que comprovam a conduta do comerciante. Em uma das gravações, ele insinua que a funcionária "fica perdendo tempo na internet" e diz que "quando você está acima do peso,  cinco, seis quilos, você perde assim, até em uma semana". Numa outra conversa, ele faz a vendedora se pesar em sua frente, embora ela alegue que está menstruada e que o fato pode interferir. A defesa, no entanto, afirma que os áudios estão "fora de contexto e editados", pois não refletem a íntegra das conversas e não revelam as datas dos diálogos. Disse também que "há clara e evidente  tentativa" de obter "possíveis palavras ou frases que possam comprometer" o sócio da loja, com a intenção de enriquecer-se ilicitamente e vitimizar-se". "Há ainda de ressaltar que a recorrida também não junta qualquer documento capaz de demonstrar tratamento psicológico ou psiquiátrico a qual foi submetida, demonstrando assim mais uma vez sua intenção de vitimizar-se diante de uma situação criada pela mesma de forma ardilosa e leviana", argumenta a defesa. Bilhetes escritos pelo comerciante também mostram a cobrança para atingir o peso, segundo a ação. "Quero ver o resultado no final do próximo mês, tá? Estou de olho. Este mês não vi diferença", escreve em um deles. "Já chegou nos 90 kls? P/ mês que vem 85 kls!!! Combinado?", questiona em outro recado.

No recurso, o advogado da loja alega que o estabelecimento nunca cobrou ou impôs metas a seus funcionárias. Sobre o pagamento dos R$ 200, justifica que não havia correlação com o salário e que a reforma trabalhista referendou o pagamento de "prêmio motivacional" sem incidência de encargos. "Urge ressaltar que a loja trabalha com o comércio de bijuterias, não atrelando suas atividades comerciais a nenhum segmento do ramo fitness, razão pela qual o peso das colaboradoras é irrelevante à manutenção do vínculo laboral", ressalta a defesa. Além da indenização, a sentença em primeira instância definiu o pagamento de horas extras e outros direitos da funcionária, como décimo terceiro proporcional, diferenças no FGTS e férias. As partes aguardam o julgamento do recurso. ÉPOCA entrou em contato com a loja por e-mail e telefone, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.*G1Foto: Arquivo pessoal

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