Falso médico preso em SP tratou câncer terminal como coronavírus, diz família.
02/06/2020 14:35 em Brasil

Após um homem ter sido preso pela Polícia Federal por falsidade ideológica e exercício ilegal de medicina em um hospital de Praia Grande, no litoral de São Paulo, prestando atendimento a pessoas com o novo coronavírus, familiares de pacientes do falso médico procuraram a Polícia Civil para registrar boletim de ocorrência. O G1 conseguiu contato com algumas dessas famílias, que relataram descaso e arrogância do homem, que ainda não teve seu nome divulgado. O falso médico usava o nome e o registro do Conselho Regional de Medicina do oftalmologista colombiano Dr. Henry Cantor Bernal. O verdadeiro especialista contou que soube que havia sido vítima de clonagem ao receber um aviso de um colega brasileiro que estaria participando de um processo seletivo para fazer plantões no hospital de São Caetano do Sul (SP) em 2018. Ele mora na Colômbia há 16 anos. Uma das pessoas que procurou a Polícia Civil foi o jovem Eduardo Felipe dos Santos Alves. Ele relatou o atendimento que foi prestado à sua avó, Maria José dos Santos, de 66 anos, que deu entrada no hospital em estado terminal de um câncer. Na ocasião, o médico teria diagnosticado que ela estava com coronavírus, sem ao menos abordar a questão do câncer. "Minha avó foi internada por neoplasia de colo e metástase óssea e uma equipe de enfermeiros liderada por este médico pediu para fazer uma tomografia e raio-x", conta. "Voltaram dizendo que ela estava com suspeita de Covid-19, tirando ela da ala comum e colocando na separada para coronavírus, onde não tínhamos acesso." "A gente só tinha informações através do boletim médico passado por ele. Sempre tínhamos problemas, porque ele mentia para a gente, dizendo que ela tinha comido bem e que estava melhorando. Queria dar alta pra ela", diz. Os resultados dos exames que comprovariam ou descartariam o novo coronavírus nunca chegaram. No último boletim, de sábado (30), o falso médico mudou o tom otimista e avisou a família que a idosa teria descido para a ala de emergência, tendo apenas mais dois dias de vida. Ela faleceu no mesmo dia. "Ela respirava bem e sem aparelhos durante todo o tempo que esteve conosco por perto. Não liberamos o corpo ainda, sequer sei se realmente é ela ali dentro. Queremos o resultado desses exames para ter um velório digno", diz. Além de atuar no Hospital Irmã Dulce em Praia Grande, onde foi preso, ele também trabalhou na PAM Rodoviária, em Guarujá, até o início de fevereiro deste ano. Mônica Cristina da Silva acompanhou a mãe, Olinda da Cruz Balula, de 79 anos, enquanto ela foi paciente dele na unidade de saúde. Ela conta que os dois tiveram uma discussão. "Nós brigamos porque ele deu alta para a minha mãe quando ela visivelmente não estava bem. Ele mandou ela pra casa com uma sonda vesical e se recusou a mandar tirar", conta. "Ele disse que tinha 20 anos de medicina e quem seria eu pra questioná-lo. Virou as costas depois disso e foi embora." A mãe dela, segundo o relato, só piorou e precisou passar por diversos médicos, que constatavam que a idosa não poderia estar com o equipamento. "Todos perguntavam o que aquilo estava fazendo ali. Mas não sou especialista, acreditei que era um médico atendendo ela." Pouco tempo depois, em dezembro, a idosa foi internada novamente e acabou falecendo de infecção generalizada. "Não digo que ele a matou, porque ela estava mal, mas tenho certeza que se ele não tivesse mandado ela para casa com aquilo, ela teria vivido mais." "Eu nunca esqueceria o rosto dele. Assim que vi que ele não era médico e cuidou da minha mãe, tudo voltou. Fiquei muito mal, não consegui acreditar", desabafa.*G1— Foto: Arquivo pessoal/Mônica Cristina da Silva

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