O auditor do Tribunal de Contas da União (TCU) Alexandre Marques afirmou em depoimento que o documento citado pelo presidente Jair Bolsonaro sobre supernotificação de casos de Covid foi alterado.
Investigado por ter sido o autor do material, Marques disse ainda que a divulgação do documento foi uma "irresponsabilidade". Ele deve ser convocado pela CPI da Covid para depor.
No dia 7 de junho, Bolsonaro divulgou para apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada que um suposto estudo do TCU concluiu que 50% das mortes por Covid em 2020 não teriam sido causadas pela doença.
Bolsonaristas chegaram a divulgar nas redes sociais um suposto documento do tribunal com esses dados.
No mesmo dia, em nota, o TCU esclareceu que não há informações em relatórios do tribunal que sustentem a afirmação do presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, o tribunal reforçou que não é o autor do documento.
No dia seguinte, o tribunal acrescentou que o documento citado por Bolsonaro era uma análise pessoal feita pelo servidor Alexandre Marques. O TCU abriu sindicância para investigar o caso e afastou o servidor por 60 dias.
Após a manifestação do TCU, Bolsonaro admitiu que errou ao atribuir o relatório ao tribunal, mas insistiu, sem apresentar provas, que há uma supernotificação das mortes. Ele ainda acusou estados de aumentarem os dados de óbitos em busca de mais dinheiro do governo federal.
As investigações do TCU foram prorrogadas por mais 30 dias. Os depoimentos colhidos até agora confirmam que o estudo não foi feito pelo tribunal e que se trata de um documento falso.
Alexandre Marques disse que no dia 6 de junho enviou ao pai - por mensagem - um breve levantamento sobre as mortes provocadas pela Covid, porque esse era um assunto do qual eles costumavam tratar informalmente.
O levantamento não continha a identidade visual do TCU - diferentemente do documento divulgado nas redes sociais por bolsonaristas - e nem as conclusões tiradas pelo presidente.
O rascunho feito por Alexandre Marques - sem alterações - foi enviado pelo pai dele, coronel da reserva Ricardo Silva Marques, a Bolsonaro.
O coronel foi colega de turma de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). O presidente o indicou para ocupar uma gerência na Petrobras.
No depoimento, Alexandre Marques presume que o documento foi alterado na Presidência da República.
"[O documento] não tinha nenhuma alusão ou identidade visual do Tribunal de Contas da União (TCU). Nesse arquivo em pdf que viralizou, não tinha nenhuma identidade visual, data, assinatura, nada. Era somente um só arrazoado", afirmou o auditor.
Ainda durante o depoimento, ele é questionado se "presume que isso foi editado depois que o arquivo foi enviado para o seu pai para a Presidência da República".
"Exatamente", respondeu Alexandre Marques.
O servidor do TCU disse ainda que Bolsonaro foi irresponsável ao vender a ideia de que mais da metade das mortes por Covid eram registros supernotificados.
"Quando eu vi o pronunciamento do presidente Bolsonaro, eu fiquei totalmente indignado, porque achei totalmente irresponsabilidade o mandatário da nação sair falando que o tribunal tinha um relatório publicado, que mais da metade das mortes por Covid não era por Covid. Eu achei bem, uma afronta a tudo que a gente sabe que acontece, a todas as informações públicas, à ciência, etc", disse Alexandre Marques no depoimento.
Os documentos e vídeos da investigação feita pelo TCU estão com a CPI da Covid.
A convocação para Alexandre Marques depor, a pedido do relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), já foi aprovada, e a comissão quer ouvir também o pai dele, o coronel Ricardo Silva Marques.
A CPI quer saber quem foi o responsável por falsificar a análise pessoal que o presidente Bolsonaro divulgou como se fosse um relatório oficial do TCU.